A obra "Necropolítica" de Achille Mbembe oferece um arcabouço teórico potente para analisar a tese proposta no artigo sobre o abismo entre a teoria e a aplicação dos direitos humanos. Mbembe introduz o conceito de necropolítica como uma extensão e revisão do biopoder de Michel Foucault, colocando em foco a capacidade dos Estados e outros atores de decidir quem pode viver e quem deve morrer. Essa análise crítica é particularmente relevante para compreender como a lógica capitalista e os interesses políticos moldam a aplicação seletiva dos direitos humanos.
Mbembe argumenta que, na era contemporânea, o controle sobre a vida se estende para além da regulação biológica, envolvendo decisões explícitas sobre a morte. Em conflitos civis, especialmente em contextos marcados por colonialismo e capitalismo tardio, o direito de matar é exercido como forma de controle social e político. Essa lógica necropolítica é frequentemente visível em situações de guerra, onde populações inteiras são desumanizadas e tratadas como descartáveis. Tal perspectiva revela como os direitos humanos são negados a grupos específicos sob justificativas econômicas e políticas.
A necropolítica expõe as falácias da universalidade dos direitos humanos. Ao abordar como certos grupos são excluídos do direito à vida, a obra evidencia a manipulação desses direitos para atender a interesses econômicos e geopolíticos. Por exemplo, em zonas de conflito como a Faixa de Gaza, mencionada no artigo, as populações locais são frequentemente vistas como obstáculos a serem eliminados, enquanto os direitos humanos dessas pessoas são relegados a um papel secundário, subordinado às estratégias de poder.
Mbembe também explora como o capitalismo contribui para a produção de "zonas de morte", onde a exploração econômica e a violência se entrelaçam. A lógica capitalista exige que certos corpos sejam exploráveis e descartáveis, legitimando ações que contrariam diretamente os princípios dos direitos humanos. Essa perspectiva ajuda a comprovar a tese do artigo, mostrando que os direitos humanos não são aplicados de forma gratuita, mas frequentemente subordinados a interesses econômicos e políticos. Um exemplo claro disso é o uso de forças militares para proteger interesses corporativos em detrimento das populações locais.
A obra de Mbembe ilumina como os direitos humanos são seletivamente aplicados, com base em critérios de utilidade para os detentores de poder. Populações marginalizadas são muitas vezes consideradas fora do escopo de proteção dos direitos humanos, revelando a hipocrisia das promessas universais desses direitos. O autor demonstra que essa seletividade está enraizada em estruturas históricas de dominação e controle, como o colonialismo, que perpetuam desigualdades globais.
A análise de Mbembe reforça a tese de que os direitos humanos são comprados e não ofertados gratuitamente. Sua abordagem teórica demonstra que esses direitos são frequentemente negociados dentro de estruturas de poder que priorizam interesses econômicos e políticos sobre a dignidade humana. Assim, "Necropolítica" oferece uma base teórica robusta para argumentar que a aplicação dos direitos humanos é condicionada por dinâmicas de poder que perpetuam desigualdades e violências estruturais.